Durante dois dias de agendas intensas, parlamentares que compõem a Comissão Externa designada pela Câmara dos Deputados para fazer acompanhamento do desastre ambiental que coloca em risco o Pantanal mato-grossense – maior planície inundada do planeta -, ouviram relatos emocionantes, contundentes e um eco quase agonizante de socorro dos povos tradicionais que interagem com um dos biomas mais importantes do ecossistema brasileiro. A diligência ocorreu nos dias 19 e 20.

“Somos os guardiões do Pantanal. Este é o nosso território sagrado, e nele estão todos os ensinamentos e a vivência que precisamos para desenvolvermos nossa vida com dignidade, onde os diferentes espaços se conectam, sejam pela agricultura familiar, pesca, extrativismo e outras formas de ocupação”, diz o trecho da carta da Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneira entregue à coordenadora da diligência, deputada Professora Rosa Neide (PT-MT).

“O Estado Brasileiro tem sido omisso e negligente com nossa situação, nos colocando em situação de miséria e vulnerabilidade, fingindo não nos enxergar”, denuncia o documento também repassado aos parlamentares Nilto Tatto (PT-SP)Paulo Teixeira (PT-SP), Rodrigo Agostinho (PSB-SP) e ao Professor Israel Batista (PV-DF), que também participaram da diligência às áreas atingidas pelo incêndio no Pantanal.

Para Rosa Neide, os documentos acolhidos, o encontro com pesquisadores, ambientalistas, comunidades tradicionais pantaneira (fazendeiros, quilombolas, ribeirinhos, indígenas, moradores da zona rural e urbana) trazem elementos e indicadores para subsidiar o início dos trabalhos da comissão.

“Nós fizemos um dia de imersão no Pantanal, que começa por verificar in loco o que está acontecendo, o fogo de fato, a fauna, a flora estão morrendo. É muito triste, desoladora a situação. Mas ouvindo as pessoas que conhecem profundamente o Pantanal, que estão aqui há mais de 300 anos, que são as famílias tradicionais do Pantanal, a gente percebe que as pessoas indicam alternativas, que mesmo sem a participação direta de governo eles vêm ao longo dos anos, cuidando, da forma que podem, do Pantanal”, constatou Rosa Neide.

A deputada reforçou a necessidade de organizar urgentemente a comissão externa para que ela possa oferecer indicadores de respostas. Segundo a deputada, não compete ao parlamento a execução da ação, mas a Câmara em conjunto com o Senado e as Assembleias Legislativas de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, podem indicar os caminhos para a correção da tragédia ambiental que assola o Pantanal.

“A Câmara e o Congresso Nacional como um todo, podem ser os receptores de todas essas angústias e depois cada órgão que vai estimular a resposta para que as comunidades se sintam alentadas e com expectativa de continuidade, porque no momento desse o que se vê é fumaça e fogo, dá a impressão que chegou ao fim. O que temos que fazer é ultrapassar essa camada espessa de fumaça, apagado o fogo, e depois, visualizar o que está no horizonte, logo ali, com as opiniões das pessoas daqui, com os conhecimentos deles, e também tem ciência com pesquisa acumulada nas universidades para que a gente consiga realmente dar resposta e alento a esse povo que tanto merece”, afirmou Rosa Neide.

Quadro desolador

O deputado Nilto Tatto contou que a comitiva sobrevoou a área que está queimando e revelou que o quadro é desolador. Para ele, a ação imediata é pressionar o governo federal para que tome medidas necessárias para acabar com o incêndio. De acordo com o deputado, a Central de Operação que atua no combate ao incêndio, só conta com 172 pessoas de todas as instituições oficiais que operam na região.

“Isso quer dizer que está se brincando de combate ao fogo. Jamais esse número tão pequeno de gente vai conseguir combater fogo nessa proporção. Então, essa talvez seja a grande urgência de chamar a responsabilidade do governo federal para que venha através da estrutura, ou seja, com as Forças Armadas, Exército, Marinha, Aeronáutica para poder reforçar o combate ao fogo”, sugeriu Tatto.

O deputado Paulo Teixeira também é da opinião que a primeira iniciativa é terminar com os focos de incêndio e cobrar a responsabilidade do governo federal e a presença das Forças Armadas no combate aos incêndios.

“É fundamental a participação do governo federal. Bolsonaro esteve no Mato Grosso, mas não esteve no Pantanal. Assim é muito importante que o Brasil exija do governo federal, do presidente Bolsonaro, a sua presença física e das Forças Armadas”, cobrou.

Recuperação do bioma

Além de apagar o incêndio, Paulo Teixeira aponta para a necessidade de se pensar em como recuperar o meio ambiente que foi afetado pelo incêndio. “Precisa de um trabalho grande que vai envolver financiamento, mudança legislativa, vai envolver diálogo com todos os atores que atuam aqui”, adiantou Teixeira.

Outro ponto elencado pelo petista diz respeito a um programa de prevenção de incêndio não só para o Pantanal, mas para todo o Brasil. “O Brasil hoje não está à altura de um enfrentamento de incêndios dessa proporção que atingiu o Brasil inteiro. Então, desenvolver um trabalho preventivo que vai no município, que vai no proprietário, que envolva brigada, que melhore a capacidade dos equipamentos de combate ao incêndio, e que os corpos de bombeiros cheguem mais cedo para impedir que se alastrem os focos de incêndio”, observou.

Aquecimento global

Na opinião de Teixeira o aquecimento global precisa ser enfrentado. Segundo ele, o desmatamento na Amazônia afeta o ciclo de chuvas na região do Pantanal e é um dos maiores motivos para esse incêndio.

“Esse incêndio pode ter sido criminoso. Há essa hipótese, mas eles se espraiarem dessa forma é por causa de uma seca prolongada. Temos que reverter o desmatamento na Amazônia, temos que reverter o aquecimento global. Temos que enfrentar o aquecimento global porque os incêndios que que estão acontecendo no Brasil são de proporções nunca vistas. O governo federal lavou as mãos diante desses desastres”, acusou Paulo Teixeira.

Estudos

Entidades que produzem projetos e pesquisas como Observa MT, Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad), Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat), Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Programa Humedales Sin Fronteiras e Projeto PELD-Pantanal, entregaram nesse domingo (20), um conjunto de estudos aos parlamentares que participaram da diligência ao Pantanal.

Na avaliação da deputada Rosa Neide, os estudos apresentados por instituições pesquisadoras de Mato Grosso deverão dar sustentação científica ao relatório sobre o Pantanal. “Não precisamos buscar pesquisas de outros lugares. Aqui nós temos quem pesquisou e quem tem domínio deste tema. Temos os povos ribeirinhos, povos quilombolas, povos indígenas, fazendeiros e fazendeiras e homens pantaneiros e mulheres pantaneiras que sabem exatamente as modificações que ocorreram no Pantanal nestes últimos 300 anos”, afirmou.

O reitor da UFMT, Evandro Aparecido, salientou que é importante analisar criteriosamente o que pode ser feito daqui para frente. Ele afirmou que a UFMT tem “uma gama” de pesquisas que vai da antropologia até questões das ciências básicas, sobre a fauna e a flora. “A universidade pode auxiliar na formatação de políticas públicas que representem soluções ambientais e de desenvolvimento econômico para a região pantaneira”, explicou.

O Professor Claumir Muniz contou que a Unemat, em seus 40 anos de existência, se sente responsável pelo Pantanal. “A instituição está de portas abertas e não vai medir esforços para auxiliar na recuperação ambiental e humana da região afetada pelas queimadas”, destacou.

Correspondente do CCN em Brasília, Benildes Rodrigues


 

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