Como manda a tradição, o Brasil abriu a Assembleia-Geral da ONU nesta terça-feira, 22. Pela primeira vez na história, uma assembleia realizada remotamente pelo computador.
O Brasil é sempre o primeiro a falar nessa ocasião, desde que a ONU foi fundada em 1945. Há duas versões que explicam o porquê do Brasil falar primeiro no evento mais importante da ONU: ou foi para evitar as tensões entre os EUA e a União Soviética, que começavam a se estranhar na famosa Guerra Fria ou porque o Brasil não teria sido incluído no Conselho de Segurança e, por isso, foi “compensado”.
A ex-presidenta do Brasil, Dilma Rousseff, foi a primeira mulher na história a fazer o discurso inicial da Assembleia-Geral, em 2011. E, nesta terça-feira, o Brasil voltou a ser destaque; o presidente Jair Bolsonaro foi o primeiro presidente brasileiro a faltar com a verdade em seu discurso feito ao vivo e para todo o mundo, o que causou estranheza e protestos.
No geral, o que se depreende do discurso de Bolsonaro é um Brasil que só existe no papel em que ele leu.
Bolsonaro disse que agiu com responsabilidade ao tratar do vírus (novo coronavírus). Não é verdade. Bolsonaro negou a gravidade da doença desde o início, dizendo que era apenas uma “gripezinha”. Propôs um auxílio emergencial que não passava de R$ 200,00 e, somente depois de muita pressão popular e ação dos partidos de oposição no Congresso Nacional, que o valor subiu para R$ 600,00. Muito inferior aos mil dólares que disse em seu discurso. Se isso fosse verdade, as parcelas do Auxílio deveriam ter sido de R$ 5.470,00. Sem falar nos problemas injustificados que excluíram milhares de pessoas para o recebimento do Auxílio.
Ao contrário do que disse, Bolsonaro não incentivou o isolamento social e nem os testes em massa para a Covid-19, como todos os países fizeram; promoveu e ainda promove aglomerações – e sem o uso de máscaras, contrariando a ciência e as recomendações médicas da Organização Mundial da Saúde, e o uso em massa da Cloroquina, cuja ineficácia já foi comprovada.
Bolsonaro não disse a verdade quando afirmou que o seu governo assistiu a mais de 200 mil famílias indígenas com produtos alimentícios e prevenção à Covid. Na verdade, ao contrário, seu governo vetou água potável, material de higiene e limpeza e cestas básicas às aldeias e proibiu a entrada de equipes da organização Médicos Sem Fronteiras nas comunidades indígenas. Além disso, não é verdade que houve investimentos para combater a Covida-19. Na verdade, a maior parte dos recursos destinados aos estados não foram liberados, obrigando os estados e municípios a agirem por conta. Faltaram equipamentos, sobrou cloroquina.
Não é verdade que o governo age rigorosamente para conter os focos criminosos de incêndios na Amazônia e no Pantanal, muito menos que o caboclo e o índio sejam os responsáveis. Até agora, as investigações levam a crer que os responsáveis e ou suspeitos pelas ações criminosas sejam fazendeiros, grileiros e invasores de terras públicas e reservas florestais e terras indígenas. A extração ilegal da madeira só acontece porque o governo Bolsonaro desmobilizou a fiscalização e protege os verdadeiros criminosos.
Bolsonaro ainda disse que o Brasil foi vítima, em 2019, de um ato criminoso de derramamento de óleo venezuelano na costa nordeste. Não é verdade. Passado mais de um ano de investigação, não há uma linha que comprove a afirmação. O que aconteceu é que o governo Bolsonaro demorou mais de três meses pra tomar as primeiras providências em relação ao desastre.
Para concluir, Bolsonaro disse na ONU que “apesar da pandemia, verificamos um aumento do ingresso de investimentos, em comparação com o mesmo período do ano passado. Isso comprova a confiança do mundo em nosso governo”. Seria cômico, não fosse trágico. Dados mostram que, na verdade, houve uma queda de 30% dos investimentos estrangeiros diretos no Brasil, além de bater o recorde de fuga de capitais na ordem de US$ 15,2 bilhões. Uma prova é que o Brasil deixou de receber US$ 250 milhões do Banco Mundial para a Educação, em função do congelamento dos investimentos na Educação.
E, por fim, apesar de ter dito que o Brasil continua contribuindo para alimentar o mundo, o certo é que Bolsonaro vem dilapidando a agricultura familiar, que até 2014 era responsável pela produção de 70% dos alimentos consumidos pelo povo. Resultado, o Brasil voltou a figurar no Mapa da Fome. E isso, claro, Bolsonaro não disse.