A gestão tucana na cidade de São Paulo tem como principal projeto de governo a entrega dos serviços públicos para terceiros. O processo começou com João Dória em 2017, prosseguiu com Bruno Covas e com certeza terá continuidade com Ricardo Nunes.
Na área da saúde, as Organizações Sociais (OSc) avançam para assumir a totalidade dos serviços. Dos 840 equipamentos municipais, 667 (79%) já estão nas mãos dessas organizações.
Ao mesmo tempo em que ampliam o domínio para abocanhar fatias maiores das verbas orçamentárias da Secretária Municipal de Saúde, as OS são alvos de denúncias de práticas irregulares de gestão. Alguns exemplos jogam por terra o argumento de que os serviços prestados pela iniciativa privada são mais eficientes.
Reportagem veiculada no fim de abril no SPTV da Rede Globo registrou grave denúncia. Em off médicos relataram que pacientes foram amarrados no Hospital Municipal da Brasilândia por falta de medicamentos de sedação para intubação.
Apesar da secretaria informar que “a imobilização pode acontecer por segurança, e que o ato não tem ligação com falta de remédios do kit intubação”, a os fatos mereciam ser apurados. Para isso, protocolamos requerimento na Comissão de Saúde para a Secretaria prestar informações, mas ele não foi aprovado.
E assim deixamos de cumprir com uma das funções mais importantes da Lei Orgânica do Município que é a de fiscalizar os atos e omissões do poder executivo.
Mesmo porque, o Hospital Municipal de Brasilândia é gerenciado pelo IABAS (Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde).
Essa OS é conhecida nacionalmente por diversas denúncias de irregularidades. O Ministério Público Estadual até recomendou neste ano à Prefeitura a não renovação dos contratos do município com o IABAS.
Terceirizar resposta
Menos de dois meses após ser inaugurado, em fevereiro deste ano, o Hospital Brigadeiro tem Inquérito Civil nº 192/2021 instaurado pelo Ministério Público Estadual por falta de condições adequadas para funcionar. Aberto para receber pacientes da Covid em seus 110 leitos, a unidade apresenta inúmeros problemas.
Após denúncia de um profissional médico da unidade e vistoria do Conselho Regional de Medicina (CRM) foram constatados falta de documentos para o alvará de funcionamento da Vigilância Sanitária e falta de alvará do Corpo de Bombeiros. Situação que coloca em risco funcionários e pacientes.
Além disso, registrava ausência de escalas médicas de plantões e elevadores com tamanho inadequado para transportar pacientes em maca.
Como se não bastasse o hospital “funcionava” sem laboratório de análises clínicas e sem aparelho de tomografia. Exames de sangue tinham que ser levados para laboratórios externos.
Com os recursos humanos quarteirizados, o Hospital Brigadeiro é administrado pela SPDM (Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina) que, para isso, recebe mensalmente R$ 4,8 milhões. Aliás, a SPDM recebeu quase R$ 1 bilhão somente nos quatro meses deste ano. A Prefeitura já repassou à SPDM R$ 971 milhões.
No inquérito, a promotora Dora Martin Strilicherk afirma que “oficiada a prestar esclarecimentos sobre os fatos, a SMS limitou-se a encaminhar informações da OSS contratada (SPDM), no qual a única notícia relevante e lamentável foi a demissão do médico representante”, justamente o profissional que relatou as denúncias.
Esse episódio revela o descaso da atual gestão que abdica da sua responsabilidade em fiscalizar a OSS contratadas. E que chega ao cúmulo de terceirizar a resposta ao MP.
*Juliana Cardoso é vereadora (PT), vice-presidente da Comissão de Saúde da Câmara Municipal de São Paulo e integrante da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança