Líder disparado em todas as pesquisas de opinião sobre a corrida ao Palácio do Planalto, inclusive favorito já no primeiro turno em várias dessas pesquisas, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedeu entrevista coletiva na manhã de quarta-feira, 19 de janeiro, em São Paulo, a alguns veículos de comunicação da chamada “mídia independente”.
Lula iniciou a conversa afirmando que Jair Bolsonaro foi eleito com o discurso de acabar com a suposta ‘velha política’, mas, contraditoriamente, disse desconhecer na história da República um presidente “tão submisso ao Congresso Nacional” quanto Bolsonaro. Lula contextualizou a submissão: “Não a um Congresso democrático, que pensa o Brasil desenvolvido, estudado, evoluído. Mas, submisso ao que tem de mais atrasado na política brasileira”, disse.
Em seguida, Lula falou sobre suas duas gestões à frente da presidência da República, quando destacou os tempos em que a maioria dos brasileiros tinha acesso à carne. “É plenamente possível o povo voltar a pensar no churrasquinho do fim de semana”, disse. Por isso, enfatizou que dará prioridade ao combate à fome e à geração de empregos se for mesmo candidato e eleito. Segundo Lula, o Brasil, hoje, é refém de uma política econômica que “só atende aos interesses do mercado financeiro”. Lula disse que é preciso colocar a desigualdade na ordem do dia, não o teto de gastos.
Apesar de ainda não ter sido oficializada a sua candidatura, Lula afirmou que não pode querer ser presidente para resolver os problemas do sistema financeiro e daqueles que enriqueceram durante a pandemia da Covid-19. “É preciso recuperar a democracia para colocarmos a desigualdade social na ordem do dia como prioridade e não o teto de gastos; para colocarmos a evolução social da sociedade e não o compromisso fiscalista do governo que faz de tudo para pagar o sistema financeiro e não a dívida social que é histórica”. “O sistema financeiro precisa entender que quando ele se sentar à mesa com o presidente, não será pra discutir os seus interesses, mas para discutir quem é que está preocupado com os milhões de brasileiros que dorme na rua de forma vergonhosa”, afirmou.
Das oito perguntas endereçadas ao ex-presidente, quatro delas abordaram a questão da composição da chapa que concorrerá à presidência da República (Lula-Alckimin). Luis Nassif, do GGN, perguntou, por exemplo, se numa situação hipotética precisasse deixar a presidência, “não seria um perigo entregar o país a alguém que não está umbilicalmente ligado ao pensamento do presidente”? Lula respondeu lembrando como escolheu o seu eu ex-vice-presidente José Alencar. “Ele era um burguesão”, lembrou Lula. Mas disse que surpreendeu-se ao ouvi-lo sobre os seus 50 anos de vida empresarial. “Duvido que alguém tenha a sorte de ter um vice que eu tive”. “Espero que se o Alckmin estiver me ouvindo agora, saiba que terá de ser igual ou melhor que o José Alencar. Aí, estarei mais tranquilo. O vice tem que ajudar a governar o país”, disse.
Lula disse que exigirá respeito do governo dos EUA caso volte à presidência, e o respeito deles ao direito dos brasileiros crescerem. “O Brasil é o país mais importante da América Latina e tem interesse em crescer junto com todos e podemos ser um grande protagonista”, afirmou. “Nós somos soberanos e não serviçais. Somos nós que definimos nossa política externa. Não somos quintal de ninguém”.
Ainda sobre Alckmin, Lula disse que não pode falar diretamente sobre o assunto, por uma razão simples, “ele (Alckmin) saiu do PSDB e não definiu para onde vai e eu não defini se sou candidato”. Há possibilidades do ex-tucano se unir a Lula para concorrer. “Não sou candidato para ser protagonista, sou candidato para ganhar as eleições, e em um momento em que o Brasil está pior do que 2003, quando tomei posse”. Lula explicou que é mais fácil ganhar as eleições do que governar, porque é preciso
conversar e fazer alianças. “Nós temos divergências? Temos. Por isso, pertencemos a partidos diferentes. Temos visões de mundo diferentes? Temos. Mas isso não impede que se construa a possibilidade de se colocar as divergências de lado e conversar sobre as convergências”, explicou. “Não terei nenhum problema se tiver que fazer uma Chapa com o Alckmin para ganhar as eleições e poder governar esse país”, disse Lula.
Já encaminhando para o fim da entrevista, Lula assumiu compromisso de ampliar a participação de mulheres e negros(as) num eventual terceiro mandato. Disse que o PT trabalha para que as mulheres e negros(as) tenham participação muito mais fortes no governo, no parlamento e, inclusive, dentro do PT. “A sociedade faz esse debate e o PT caminha junto com ela”.
Lula falou sobre as eleições estaduais. Em relação ao lançamento de candidaturas do PT, ao mesmo tempo em que o partido trava conversas com outros partidos de esquerda, sobretudo o PSB e o PSOL sobre apoio a lideranças nos estados. “Tudo dependerá de quem tiver mais chances”. Lula, no entanto, mostrou-se entusiasmado com a desempenho de Fernando Haddad (PT), em São Paulo. “Nós vamos fazer no momento certo uma avaliação para ver quem tem mais chances. Se for o Márcio França (PSB), vamos conversar com ele. Mas eu acho, com toda a modéstia, que o PT nunca esteve tão próximo de ganhar o governo do Estado como está agora”.
“O PT não está fechado em suas candidaturas. Todos têm o direito de lançar seus candidatos. Precisamos apenas afinar a viola. Se tem uma coisa que eu gosto de fazer é conversar. Eu ia conversar com o Kassab, mas ele está com a Covid-19. E vocês sabem que de uma boa conversa, sempre sai uma boa coisa”, disse Lula.
Lula exemplificou ainda os casos de Pernambuco, cuja disputa está entre Humberto Costa, Geraldo Júlio e Marília Arraes. O mesmo no Espirito Santo. “Quando o senador Fabiano Contarato (PT) entrou no PT não era pra ser o nosso candidato lá. Foi dito a ele que nós estávamos em conversações com o PSB”. Falou também sobre o apoio do PT a Marcelo Freixo (PSB) ao governo do Estado do Rio, e no Maranhão, com apoio a Flávio Dino (PSB) para o Senado.
Por fim, Lula acrescentou a cereja do bolo; afirmou que não só vai retomar com o ministério da Cultura, como vai criar um Comitê de Cultura no País. “Esse país só será soberano, democrático e respeitado quando todo mundo tiver acesso aos bens que ele ajuda a produzir. Quando todo mundo puder estudar, comer e ter acesso à Cultura. Aliás, eles têm tanto medo da Cultura que acabaram com o ministério. Pois eu vou fazer uma conferência de Cultura e vou criar um Comitê de Cultura. Não vai ter mais só um ministro de Cultura, é um “Comitê de Cultura”, pra ajudar a construir um país mais democrático. “Quem tiver medo de Cultura se prepare, porque vai funcionar mais forte no próximo governo”, finalizou.