No dia 23 de abril, Ahmaud Arbery foi assassinado enquanto corria nos Estados Unidos. No Brasil, no mesmo dia, David Nascimento foi levado por uma viatura enquanto esperava comida e encontrado morto no dia seguinte. No dia 19 de maio, João Pedro foi baleado em casa durante uma operação policial no Rio de Janeiro.
No dia 20 de maio, João Vitor foi baleado durante uma entrega de cesta básica, também no Rio de Janeiro. No dia 25 de maio, George Floyd foi sufocado por um policial durante uma abordagem e avisou "não consigo respirar" (Estados Unidos). No dia 30 de maio, Mateus Oliveira, 23 anos, foi executado com um tiro em Catrambi, no Rio de Janeiro. O que todas essas mortes têm em comum? Todos foram executados pela polícia. Em nenhum dos casos existem coincidências, em todos os casos o que existe é o racismo.
Tempos difíceis pedem reações fortes e elas começaram a aparecer. Mesmo com a pandemia, as bases da sociedade estão se movendo.
O assassinato de Floyd deu inicio a uma onda de protestos com a causa antirracista e antifascista. Diversos grupos, cidadãos isolados e movimentos sociais aderiram à causa das manifestações nas ruas com a depredação de lojas e destruição de delegacias policiais. A polícia reagiu com extrema violência contra manifestantes e em várias cidades foi decretado toque de recolher.
No sexto dia de protestos contra o assassinato, manifestantes tomaram as ruas de mais de 50 cidades dos Estados Unidos – em 25 delas contrariando o toque de recolher. Segundo alguns manifestantes, pessoas negras têm todo o direito de queimar um país que elas construíram de graça. Ou como já disse Malcon X "Não confunda a reação do oprimido com a violência do opressor."
O policial branco Derek Chauvin, que matou George Floyd, foi detido e acusado de homicídio no dia 29. Documentos obtidos pela rede americana CNN mostram que a fiança do policial foi estabelecida em US$ 500 mil.
No dia 30, Donald Trump escreveu, em página no Twitter, que iria classificar o movimento ANTIFA (Antifascista) como uma organização terrorista nos Estados Unidos. A publicação foi compartilhada por Bolsonaro. Após essa afirmação os protestos se intensificaram e os manifestantes entraram nos jardins da Casa Branca, sede do governo e residência oficial de Donald Trump, que teve suas luzes apagadas pela primeira vez na história. Os protestos que tiveram início no domingo (31) entraram pela madrugada de segunda-feira, 1º de junho, e remontam aos atos de abril de 1964, após a morte do ativista Martin Luther King.
Quando falamos de violência vemos que a polícia nos Estados Unidos é brutal e estruturalmente racista, mas, de acordo com o The Washington Post, em 2019, a polícia inteira do país matou 1011 pessoas. Já no Brasil, somente no Rio de Janeiro, foram 1810 casos e, em São Paulo, 733 casos de pessoas assassinadas pela policia. Desde o início da pandemia, as mortes por polícias aumentaram 43%, somente no Rio de Janeiro.
Aqui no Brasil, as ações antifascistas também já tiveram início. No dia 31, vimos manifestações antifascistas e antirracistas em São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte e Curitiba. Um importante passo, mostrando que, mesmo em meio à pandemia, não vai ser somente a extrema direita que ocupa as ruas. Vale registrar dois deles; o protesto contra o racismo em frente ao Palácio da Guanabara, no Rio de Janeiro, e torcidas organizadas em um ato conjunto antifascismo na Avenida Paulista, em São Paulo.
Ao mesmo tempo, em uma live, Bolsonaro usou símbolo nazista de supremacia racial, bebendo leite. O leite é uma referência neonazi de tornar-se branco. A Fundação Palmares lançou o selo para quem foi 'injustamente' acusado de racismo com um certificado de que a pessoa, acusada de racismo, está sendo, na verdade, vítima de campanha de difamação e execração.
Precisamos nos unir e agir assim como nossos irmãos dos Estados Unidos. Viver livres está em nossas mãos. Não podemos permitir que os fascistas sigam seu plano e seu curso e a luta antifascista deve ser também antirracista. Sim, todas as vidas importam, mas estamos focando nas vidas negras porque o sistema policial e judicial não sabem disso. O racismo estrutural está perfeitamente alinhado para que isso ocorra e, inclusive, quem ainda não percebeu é parte do problema.
A democracia que queremos não pode seguir com o genocídio da população negra das periferias. Racismo não é assunto delicado se você não é racista.
Não é sobre negro contra branco. É sobre todos contra os racistas.
Vidas negras importam!
Anatalina Lourenço
Cientista Social e professora das redes públicas estadual e municipal de São Paulo