Atribui-se ao então presidente general Emilio Garrastazu Medici a célebre frase proferida em plena ditadura militar no começo dos anos 70: “A economia vai bem, o povo vai mal”.
Há, porém, quem conteste essa autoria e credite essa declaração ao então ministro da Fazenda, Delfim Neto. E essa afirmação se coloca no contexto para explicar o então crescimento da economia, mas sem distribuição de renda. “Primeiro vamos fazer o bolo crescer para depois dividi-lo”, disse Delfim, o czar da Economia. Mas a história mostrou que nem migalhas sobraram.
Transplantada para os dias atuais, essa frase revela várias tragédias. Hoje, ou melhor, há cinco anos a economia não vai bem e o povo muito menos.
Como se não bastasse, o ex-capitão que ocupa a cadeira presidencial não esconde o saudosismo da ditadura. Não cansa de emitir sinais inequívocos de que caminhamos para um estado autoritário.
Enquanto isso, não se dá conta de que as mazelas da economia parecem não ter fim.
Mesmo com todas as benesses concedidas por incentivos fiscais, a montadora norte-americana Ford anunciou que vai deixar o Brasil.
São 7 mil empregados na rua. E outros 50 mil empregos indiretos que vão para o espaço. Ou melhor. O destino da produção é a Argentina.
Tal qual no combate à pandemia, o governo federal se omite. Nenhum gesto para negociar a permanência da produção por aqui.
Na mesma esteira, para engordar as estatísticas do desemprego que bate recorde, a direção do Banco do Brasil acaba de anunciar que vai fechar 361 agências espalhadas pelo País. E demitirá 5 mil funcionários.
Sem foco e sem se preocupar com a retomada do crescimento econômico, Bolsonaro prefere mirar sua artilharia para outros alvos como processos judiciais contra jornalistas prometidos pelo seu ministro da Justiça.
Sem esquecer sua declaração de que era preciso fuzilar uns 30 mil, levanta dúvidas se a ex-presidenta Dilma Rousseff sofreu tortura durante o regime militar.
Não satisfeito em liberar mais compras de armamentos e munição para civis, Bolsonaro agora trama no Congresso Nacional a transferência das polícias civil e militar dos Estados para o governo federal.
Pode parecer irrelevante? Na Bolívia há quatro anos as polícias militares tiveram papel decisivo na derrubada de Evo Morales.
Não precisamos ir longe. Em janeiro do ano passado, no motim dos polícias militares no Ceará a voz de comando dos insurretos era alinhada a Bolsonaro.
No Congresso, os projetos que tiram dos governadores o controle das polícias avança e são capitaneados pela bancada da bala. Eles são 300 deputados. E todos rezam pela cartilha de segurança do governo federal.
Com a economia em frangalhos e crescimento pífio, com o povo sem auxílio emergencial e sem emprego, a eclosão de manifestações de rua deixam de ser hipóteses.
Além de poder acionar o dispositivo da lei e ordem, o governo federal com controle das polícias terá a faca e queijo na mão para reprimir as vozes das ruas.
* Juliana Cardoso é vereadora (PT), vice-presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança, Adolescente e Juventude e membro das Comissões de Saúde e de Direitos Humanos da Câmara Municipal de São Paulo.