Amanhã o povo brasileiro acordará com o noticiário apontando, quase em tom de festa, que o PT não venceu em nenhuma capital nas eleições municipais de 2020.

Esse é o tom que domina a grande mídia desde 2014, quando o consórcio golpista que pariu o bolsonarismo começou a ser organizado.

Articulistas “isentos” cobrarão autocrítica do partido e apontarão o surgimento de novas lideranças que aparecerão só para dar um pretexto para o discurso de que o PT precisa ceder espaço cá e lá.

Vamos esclarecer as coisas:

O PT perdeu 8,21% de vereadores no país. O PSDB, 18,44%. Quem perdeu mais?

Em prefeituras, foram menos 31,5% (dados do primeiro turno). O PSDB, 32,92%. E aqui? Quem perdeu mais?

E o que falar do PSL? Partido com o segundo maior caixa do fundo eleitoral, sigla de Bolsonaro nas eleições presidenciais de 2018, elegeu somente 90 prefeitos no primeiro turno, menos da metade do PT.

Isso mostra como comparações são precárias em. E coloca em xeque as manchetes: por que só o resultado eleitoral do PT é objeto de discussão?Essa é uma das armadilhas colocadas contra nós e o nosso partido todos os dias, e que precisamos evitar sem pensar duas vezes.

E o que dizer da autocrítica? Onde estavam as vestais da pureza quando Aécio Neves colocou em xeque o resultado eleitoral de 2014?

Ou quando o PSDB aderiu ao governo Bolsonaro, posto que há ao menos um tucano no alto escalão daquele governo?

Feitas essas considerações, olhemos para frente.

Precisamos sim compreender melhor o que mobiliza os excluídos nos dias atuais. E o mundo do trabalho ainda é uma chave poderosa para interpretar a política e seu tempo.

É preciso olhar com mais atenção para os PJs, que estão muitas vezes fora do sistema de proteção social. É preciso entender os anseios das donas de casa. Ouvir o motorista de aplicativo. A vendedora de cosmético. O jovem formado com bolsa do PROUNI, criação nossa, que recusa o voto progressista.

Entender o que pensa a mulher preta, periférica, mãe solteira, evangélica. Ser generoso com quem tem visões de mundo moralmente diferentes do establishment da esquerda universitária.

E, acima de tudo, lembrar que todos são trabalhadores e que as relações de opressão não mudaram em sua essência.

Com isso, precisamos trabalhar fortemente para construir novos horizontes de sonho e esperança. E mostrar, com nossas ideias, que há sim possibilidade dos trabalhadores concretizarem uma vida materialmente mais confortável. Formar os filhos. Ter acesso a serviços públicos de qualidade com atendimento digno.

São precisamente essas pessoas que estão em disputa hoje.

Gramsci, ao conceber seu pensamento político, na perspectiva de construir a contra hegemonia na Itália, afirmou que todos os homens são intelectuais.

Dito isso, classificou-os como orgânicos e tradicionais. Estes últimos, disputados pelos blocos contra hegemônicos. As condições para compreender seus anseios estão dadas. Não temos que reinventar a roda. Tampouco achar que vamos pautar os anseios do povo. Temos que ouvi-los atentamente. Nos despir dos nossos lugares de classe. Dos nossos preconceitos e das nossas prioridades pessoais. Trabalhar sim para fazer avançar agendas importantes, mas sempre de forma generosa e acolhedora. Passo a passo.

Nossa força nas periferias mostra que parte do caminho já foi percorrido. Basta continuar ouvindo. Entendendo. Respeitando.

Avançou o campo civilizatório contra o retrocesso. Bolsonaro foi o grande derrotado.

Virá o tempo da nossa vitória. Que saibamos refletir e agir.

Ainda estamos do lado certo da história.

 

Professora Bebel é deputada estadual pelo Partido dos Trabalhadores e presidenta da APEOESP