Até antes do início da pandemia, que já ceifou a vida de mais de 500 mil brasileiros, poucos de nós conhecíamos esta palavra: teletrabalho. No entanto, agora, transformou-se na nova moda do mundo do trabalho. Diria que é o “canto da sereia” dos patrões.

O teletrabalho foi incluído na legislação brasileira pela Reforma Trabalhista, por meio da Lei 13.467/17, e é previsto no artigo 75 da CLT. O governo Temer articulou-se com o empresariado, principalmente da FIESP, para impor a reforma à época, sem que houvesse negociação com sindicatos e centrais sindicais. Vê-se, portanto, que os empresários já planejavam a implantação do teletrabalho muito antes da pandemia, o que comprova nada ter a ver com a crise sanitária que vivemos e, muito menos, com a preservação de vidas. Pelo contrário, empresários diziam no início da pandemia que era um absurdo parar a economia por causa da morte 5 mil, 7 mil ou até 15 mil trabalhadores. Inventaram, inclusive, o “turismo da vacina”, quando empresários contrataram pacotes de viagens aos EUA, cujo roteiro era tomar a primeira dose, esticar uns 15 dias em Cancun, no México, e voltar aos EUA para a segunda dose. Enquanto isso, os brasileiros morriam aguardando desesperados a chegada das vacinas.

O melhor cenário

A ocasião não podia ser melhor para que os empresários auferissem mais lucros. Na resistência, os trabalhadores pediam o teletrabalho para preservar suas vidas e, claro, os empresários aproveitaram a ocasião para aumentar seus lucros e, principalmente, abolir milhões de empregos com a implantação do teletrabalho.

Evidente, que sindicatos e trabalhadores só devem aceitar o teletrabalho de forma provisória para a preservação de vidas e jamais defender o teletrabalho de forma permanente, porque, como vimos, é o responsável direito pela eliminação de empregos.

Mas, infelizmente, tem muitos sindicatos embarcando na “canoa furada” do teletrabalho permanente. Numa recém-pesquisa divulgada pelo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), revela que, aproximadamente, 13,1% da mão de obra ativa de São Paulo, estava em teletrabalho. Assim, milhares de restaurantes, padarias, lanchonetes e cafés não reabriram e foram à falência. Levaram consigo milhares de postos de trabalho, porque não tinham mais clientes.

Hoje, milhões de trabalhadores estão em suas casas trabalhando virtualmente e aumentando os lucros dos patrões que não pagam energia, internet, água, aluguel, manutenção dos locais de trabalho e etc. Enquanto milhares de vigilantes, auxiliares de limpeza, porteiros, copeiras e tantos outros foram para a vala comum do desemprego. Estamos passando um “cheque em branco” ou um “PIX” para fortalecer e consolidar a reestruturação do trabalho sob a bandeira da preservação de vidas. Antes que façam mal juízo, é preciso repetir; teletrabalho permanente nunca! Somente em casos excepcionais.

Na Prefeitura

Aqui em São Paulo, o ex-prefeito Bruno Covas, em outubro de 2020, aproveitou-se da pandemia para, muito discretamente e quase sem oposição dos sindicatos municipais, publicar o Decreto 59.755, de 14 de setembro de 2020, instituindo o “regime permanente de teletrabalho nos órgãos da administração direta, autarquias e fundações do município”. Ou seja, na surdina, Covas implantou o teletrabalho para retirar direitos dos funcionários públicos, alegando a “preservação da vida”.

Na verdade, o teletrabalho, num futuro próximo, vai facilitar a terceirização dos serviços públicos, principalmente, dos chamados “serviços burocráticos”.

No último dia 2 de julho, a Secretaria Municipal de Educação (SME) publicou a Portaria 4.291/21, instituindo uma Comissão que irá, em 60 dias, regulamentar o teletrabalho permanente. Resultado, centenas de postos de trabalho em cargos e funções da SME, COGEP, Diretorias Regionais de Educação e das secretarias de escolas serão eliminados ou terceirizados. E, sem resistência, porque os funcionários públicos estarão isolados em suas casas preocupados em responder e-mails e cumprir com as tarefas demandadas.

Aliás, ataques aos direitos ao funcionalismo aprofundaram-se com a aprovação da Lei 14.437/20 que ampliou a contratação de 3 mil para 12 mil professores e funcionários com vínculos trabalhistas precarizados e quase sem direitos. Com isso, não teremos concursos públicos pelos próximo dois anos. A Prefeitura vai economizar nas costas dos funcionários, aproximadamente, R$ 11 milhões anuais ou R$ 22 milhões, durante o período de vigência dos contratos precarizados  de cerca de 9 mil professores que estão impedidos de terem Jornada Especial Integral de Formação de 40 horas aulas.

Enfim, o teletrabalho permanente é o novo canto da sereia dos patrões e dos governos privatistas.

*Roselei Julio Duarte  é Professor de História e Diretor de Escola.