O papel de esperança do futuro foi jogado no colo das crianças. Se a frase popular gera comoção, na prática, temos uma sociedade que nutre um profundo desprezo por elas. Poderia citar uma série de infrações contra o direito à infância no nosso país, inclusive, quem é considerada uma criança. Mas hoje quero me deter sobre a Lei de Alienação Parental (LAP).

Em vigor desde 2010, ela foi criada com o objetivo de proteger as crianças, e define AP como “conjunto de práticas promovidas ou induzidas por um dos pais ou por quem tenha um adolescente ou criança sob sua autoridade, guarda ou vigilância, com o objetivo de levá-lo a repudiar o outro genitor ou impedir, dificultar ou destruir vínculos entre ambos”.  

Contudo, apesar da boa intenção, a LAP está repleta de aspectos polêmicos.

A lei é baseada na teoria de “Síndrome de Alienação Parental”, desenvolvida em 1985, pelo psiquiatra estadunidense, Richard Gardner. Abertamente defensor da pedofilia, ele atuou como perito jurista em diversos casos de pessoas acusadas de abuso sexual e pedofilia. Gardner, inclusive, participou da defesa legal do diretor Woody Allen, acusado de pedofilia, utilizando a “alienação parental” contra Mia Farrow. Ameaçando tirar a guarda de todos os seus filhos, ela retirou todas as acusações contra Allen antes do caso ir ao tribunal e ele saiu inocente.

A LAP foi feita às pressas e sem nenhuma participação de órgãos de proteção à infância, tampouco de mães na única audiência pública que a precedeu. Segundo reportagem da revista “Azmina”, são 82% de alegações feitas por pais, contra 50% feitas por mães, sendo 70% destas alegações feitas por pais favoráveis a eles. Os dados do “Anuário de Segurança Pública” também contradizem essa narrativa misógina, apontando que a LAP é majoritariamente favorável aos homens, prejudicando investigações rigorosas sobre as acusações. Assim, a criação dessa narrativa de que mães manipulam as crianças para forjar acusações de abusos contra seus genitores, desmerece e invalida a denúncia, o relato das vítimas e uma possível investigação.

Ao histórico papel da mulher “louca, desprezada e vingativa” que deseja punir o genitor, acusando-o de abuso, temos o respaldo judicial, reforçando os papéis de gênero. Se o machismo além de estrutural é institucionalizado pela LAP, como proteger verdadeiramente as crianças, já que muitas delas têm sido entregues pelo Estado aos seus abusadores? As falsas denúncias de “alienação parental” têm permitido inúmeras anulações de acusação de estupros de vulneráveis.

O Brasil é o único país do mundo onde a lei está vigente e as discussões sobre sua revogação não encontram força no debate público. Assim, nesse porvir que tanto ansiamos e jogamos em seus colos, estamos realmente protegendo as crianças ou manutenção das estruturas?

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Autoria
Lorrane Rodrigues é educadora e mestra em história cultural. É cocriadora do “Mandei a Acadêmica Chorar”, um podcast sobre educação e comunicação. Atualmente pesquisa sobre violência de Estado na América Latina a partir dos movimentos de mães.
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